MOURINHO DA CULTURA

Tuesday, October 09, 2007

MICHELANGELO ANTONIONI (1912-2007)




IDENTIFICAÇÃO DE UM CINEASTA

Michelangelo Antonioni faleceu a 30 de Julho deste ano na sua casa de Roma tinha 94 anos de idade e deixou-nos, por triste coincidência, cerca de doze horas depois de outro mestre: Ingmar Bergman. Foi um dia fatídico que deixou a cinefilia duplamente enlutada e mais pobre nas suas referências. Foram-se os homens ficam as obras e os mitos. Antonioni nasceu em Ferrara (Itália) a 29 de Setembro de 1912 e foi, a par com Rosselini, uma das figuras mais controversas da história do cinema italiano, cinema esse que viveu a sua época dourada na década de 60, num tempo que coincide com o apogeu do realizador e dos seu filmes mais emblemáticos. Foi precisamente com Roberto Rosselini com quem Antonioni começou a trabalhar como argumentista no filme de propaganda fascista Un Pilota Ritorna (1941), sobre a aviação do Duce. Antes disso escrevia críticas de cinema. Estreou-se como realizador com Escândalo de Amor, em 1953, uma história de adultério revelando a bela Lucía Bosé, uma das suas musas. Mas a sua consagração internacional obteve-a em 1960 no Festival de Cannes, onde apresentou o controverso, A Aventura, entre aplausos e apupos, para uma enigmática história de amor e fuga. Seguiram-se os dois filmes que completam uma trilogia, intitulados, A Noite (1960) sobre um casal em crise, O Eclipse (1961), com Mónica Vitti, (a actriz que mais intimamente ficará ligada sua vida e obra) perdida numa Roma fantasmagórica. Na continuidade, estreou Deserto Vermelho (1964) o seu primeiro filme a cores, uma profunda reflexão sobre o homem e a industrialização.
Em 1966, realizou Blow-Up-História de um Fotógrafo, talvez o seu filme mais popular e comercial, baseado num famoso romance de Julio Cortázar, onde propôs, essencialmente, uma extraordinária reflexão sobre a manipulação das imagens fotográficas e a sua interpretação. Na mesma linha situava-se o seu filme seguinte Zabriskie Point (1969) – Deserto de Almas, a sua experiência norte-americana, que é um road movie, onde novamente procura combinar pretensões metalinguísticas com uma visão marcadamente comercial. Pouco a pouco começou a decrescer o interesse pela obra de Antonioni, embora este continuasse febrilmente activo na sua militância cinematográfica, primeiro com o thriller jornalístico Profissão: Repórter (1975) um filme sobre a troca de identidade, famoso pelo seu plano sequência final. Segue-se Mistério de Oberwald (1981), uma curiosa experimentação no dominio do vídeo, pioneira da tecnologia de alta definição, sobre uma obra clássica de Jean Cocteau, além do notável drama de Identificação de uma Mulher (1982), que muitos veêm como uma obra menor e vagamente autobiográfica. A sua última longa-metragem, Para Além da Nuvens (1995) foi já co-dirigida por Wim Wenders, com Antonioni marcado pela incapacidade física. Verdadeiramente, o último filme assinado pelo veterano realizador foi Il Filo Pereicoloso delle Cose, uma curta-metragem incluída na obra colectiva Eros, apresentada em 2004 na Mostra Cinematográfica de Veneza. Desde os seus primeiros filmes que Antonioni pareceu preocupar-se com os males da sociedade e com um certo sentimento de incomunicabilidade entre as pessoas. Talvez por isso os seus filmes estejam pejados de silêncios e fossem construidos de uma forma complexa de modo a captar desesperadamente um certo vazio existencial da burguesia, e da época, ao mesmo tempo que causavam um forte impacto social e ideológico. Se Antonioni, mais pela doença, já não tivesse o prestígio e a aura mítica que teve nos anos 60, não deixa de ser importante fazer uma revisitação da sua obra e em particular de Profissão: Repórter, com Jack Nicholson, num dos mais brilhantes papéis da sua carreira. Trata-se de um filme que mais do que nunca encaixa nesta edição do Festival Internacional de Cinema do Funchal, pois pode revelar aos espectadores profundas surpresas e uma estranha actualidade, além de no plano pedagógico e cinéfilo ser uma das grandes chaves para a compreensão do cinema mundial das últimas décadas.

José Vieira Mendes

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