TELEVISÃO PÚBLICA VS. TELEVISÃO PRIVADA
Uma nova televisão em Portugal será a boa surpresa de 2008…
As novas ‘medidas revolucionárias’ anunciadas recentemente pelo Presidente Sarkozy, e em particular para o audiovisual, prevêem uma revolução cultural no serviço público de televisão. Sarkozy defende a supressão total da publicidade nos canais públicos, sugerindo que estes passem a ser financiados por taxas mínimas impostas às receitas publicitárias, geradas pelos canais privados e pelos novos meios de comunicação social. Em Portugal, estamos face a uma profunda crise no mercado publicitário, ao mesmo tempo que está para breve o aparecimento de um novo canal generalista e novas plataformas de televisão. O princípio fundamental defendido por Sarkozy, que ‘se a televisão pública funciona como as privadas, não vejo qual é o interesse de ter uma televisão pública’, retoma um tema quente no actual contexto da televisão em Portugal.
Nesta euforia das transferências para os lugares de decisão e dos “artistas” mais populares, tem-se insistido (e protagonizado na figura do Nuno Santos que entretanto se mudou para a concorrência) na subida de audiências da RTP em 2007, em relação à queda imparável da SIC. Em primeiro lugar, fazer televisão é um trabalho de equipa, em segundo, a SIC foi durante quase uma década a líder de audiências e a pioneira de uma nova fórmula de fazer televisão em Portugal. Formou grandes profissionais, como o seu actual director de programas, e criou ainda a SIC Notícias, até há pouco líder de audiências no cabo. No seu conjunto, todos os canais da SIC têm “boas audiências” e conteúdos muito bem dirigidos. A crise da SIC generalista parece ter-se acentuado com a crise de receitas de publicidade e daí algum desespero em relação às audiências. De facto, não se pode fazer omeletas sem ovos. E aqui, ficou a RTP a ganhar ao contratar na concorrência e ter sabido transportar em parte, para o serviço público, o modelo SIC. É verdade que a RTP conseguiu subir nas audiências, mas conseguiu-o por se tornar numa herdeira da SIC. A RTP pode não ter a agilidade, mas tem meios e recursos que os canais privados não têm. A grande novidade da SIC, quando foi líder de audiências, assentava em conciliar os gostos e necessidades das classes altas, graças a uma informação rigorosa, com o protagonismo dado ao cidadão comum, em programas de natureza social e de entretenimento. No fundo, foi tudo aquilo em que a RTP apostou, porém com algumas mudanças visíveis. Seja como for, a SIC continua a ser a melhor escola de televisão dos últimos anos, seja ela generalista ou temática e começou já a fazer os seus estragos no mercado.
A televisão generalista em Portugal tem perdido fôlego com vantagem para o cabo, instalando-se em todos os canais um cinzentismo em termos de criatividade e de programação, pouco apelativo à publicidade e aos espectadores mais cultos e exigentes. Quando os analistas e patrões dos media dizem que não há mercado publicitário para um novo canal de televisão, discordo em absoluto. Uma nova televisão em Portugal será a boa surpresa de 2008 se conseguir dar um abanão ao actual panorama, abrindo portas à criatividade, ao emprego e mais espaço para os autores, artistas e técnicos. Como defensor de uma televisão pública (no sentido estrito e clássico de educar, informar e entreter) neste contexto, este modelo de financiamento público, de uma televisão suportada pelo Estado e pela publicidade, já não parece de todo o mais adequado, pelo seu carácter mercantilista e dependente das audiências.
José Vieira Mendes, Jornalista
Ex-Director da PREMIERE-A Revista de Cinema
In Sol, 02/02/08
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