FILMES DO MUNDO
Face ao poder da indústria americana, realizadores como os Irmãos Coen, Paul Thomas Anderson, Joe Wright, ou Julian Schnabel, demonstraram na útima temporada cinematográfica que existe um outro cinema de autor, mais vacilante, autêntico e universalista, onde as origens nacionais se diluem em conceitos místicos e humanistas, que caracterizam um novo conceito de world cinema. Trata-se de um conceito que começa agora a despontar sem ser propriamente dirigido às minorias ou o resultado de cinematografias menos produtivas e de países do terceiro-mundo. O próprio facto dos Oscars para interpretação terem sido entregues exclusivamente a actores não-americanos, vem revelar que a sede da indústria de cinema já não está em Hollywood. Antes sofreu também o efeito da globalização, uma tendência que se confirmará em breve no Festival de Cannes, que se realizará entre 14 e 25 de Maio, e que em termos de indústria mundial marca uma nova temporada cinematográfica.
Em relação às nacionalidades dos filmes, e neste universo globalizado, começam a multiplicar-se as co-produções e as obras dos chamados ‘cineastas viajantes’, sendo cada vez mais difícil identificar exactamente qual a proveniência de um filme. Julian Schnabel deveria ter concorrido pela França ou pelos EUA? Persépolis é um filme francês ou iraniano? Expiação, uma adaptação do romance de Ian McEwan, sera britânico ou norte-americano? A noção de nacionalidade acabou por diluir-se e perdeu importância, relativamente aos géneros, aos lugares e às línguas, fundindo-se num enorme melting pot cultural, que está dar bons resultados em termos das obras estreadas, mesmo quando são característicamente americanas como Este País não é Para Velhos ou Haverá Sangue. Babel, apesar de não ter sido muito bem recebido pela crítica o ano passado e ter, inclusive, falhado nos Oscars, representa como que o acto fundador deste novo world cinema, que está mais próximo do grande público, graças à sua estrutura narrativa fragmentada, a uma vocação universalista e a uma certa maneira particular de contar pequenas epopeias que ultrapassam as barreiras linguísticas e culturais.
Um grande exemplo desta tendência chama-se O Outro Lado (Auf der Anderen Seite), do premiadíssimo realizador e produtor alemão de origem turca Fatih Akin (A Noiva Turca), filme que infelizmente tarda em estrear em Portugal. Trata-se de um melodrama espiritual, deslocalizado (entre a Turquia e a Alemanha), que faz a ponte entre duas culturas que começam a assimilar-se mutuamente, quanto mais não seja pela via da circulação das pessoas. Não foi por acaso que Guillermo Arriga, (o argumentista de Babel) se tornou uma espécie de inspirador oculto do filme, já que O Outro Lado (Auf der Anderen Seite) faz lembrar um pouco Babel e o cinema de Iñárritu. Isto é, na vertigem sentimental e mundial, várias personagens cruzam-se sem nunca se verem e os seus destinos influenciam-se através de continentes diferentes.
De facto, a noção de origem e cultura dos filmes tende cada vez mais a esbater-se através de conceitos de cinema cada vez mais alargados e humanistas. Neste enorme caldo cultural assistimos, também, a uma cada vez maior afirmação dos jovens cineastas educados no sistema do antigo Leste europeu, como aconteceu o ano passado em que os romenos foram os maiores, tanto no plano político e social, como no estético: 4 Meses, 3 Semanas, 2 Dias, de Cristian Mungiu ou Califónia Dreamin’ (Nesfarsit), de Cristian Nemescu – interpretado pelo actor americano Armand Assante –, o primeiro filme de um jovem realizador, recém-falecido num acidente de automóvel e que estreia esta semana. Esperemos apenas que não seja uma moda, já que estes filmes são sinais do que pode vir a ser o futuro da produção cinematográfica e o prelúdio de uma maior abertura destas cinematografias ao mundo e do mundo a elas.
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