A CINEMATECA DE AUTOR
Com a ida da nova Ministra da Cultura ao Porto para dar um sinal de ‘uma política baseada na proximidade’ (este conceito de proximidade entrou definitivamente no discurso das políticas culturais em vez de descentralização e ainda bem!), voltou-se a falar da criação de um polo da Cinemateca na cidade. Não há muito tempo circulou uma petição online ao Presidente da Câmara, por iniciativa, creio do Cineclube do Porto (que defende igualmente esta extensão da Cinemateca), relativamente a duas salas portuenses: o Cinema Águia D'Ouro e o Cinema Batalha. O Cinema Águia D'Ouro está fechado há décadas e corre o risco de desaparecer dado ao seu elevado estado de degradação. O Cinema Batalha de grande tradição na cidade, foi recuperado mas a sua abertura tem sido adiada. Houve vários projectos para esta sala de cinema, mas todos acabam por desistir porque é difícil rentabilizá-los. Apesar da questão cultural na cidade do Porto ser complexa (esta é a humilde visão de um lisboeta) há que reconhecer que a Fundação de Serralves, Casa da Música e o Teatro São João e o Fantasporto são instituições que nos podemos orgulhar pela forma como dinamizam os seus públicos tranversalmente. Tomaram algumas em Lisboa. Juntar-lhe a reabertura da Casa das Artes e a futura Casa do Cinema Manoel de Oliveira seria extraordinário e uma grande fortuna para todo o País. Resta saber até que ponto uma simples extensão da Cinemateca, permitirá acabar com a carência de exibição cinematográfica no Porto. Em Lisboa já é outra conversa. Por isso antes de se pensar no polo do Porto, e assentar em discursos políticos para agradar às elites nortenhas, urgente é dar mesmo um novo rumo à Cinemateca Portuguesa-Museu do Cinema do qual depende obviamente o resto. A nomeação de um novo director — não está em causa o trabalho do Pedro Mexia, que afirmou que pretende para já apenas cumprir o seu mandato de sub-director — tem sido sistematicamente adiado (e não se percebe porquê?) desde o falecimento em Maio passado do mítico João Benárd da Costa. É tempo perdido fazendo perdurar cada vez mais uma herança pesada, mesmo com o que tem de boa, para quem vier a ocupar no futuro a direcção. Uma das melhores Cinematecas da Europa (é preciso não esquecer o fabuloso espólio filmográfico do ANIM-Arquivo Nacional das Imagens), está em velocidade cruzeiro e parece resistir à mudança, enquanto não tiver um novo líder. Tornou-se numa realidade um pouco semelhante ao cinema português: uma ‘cinemateca de autor’ que mantêm as profundas marcas pessoais deixadas pelo seu último director. E muito difíceis de renovar quanto mais não seja pela forma como todas as instituições e as pessoas que as compôem, sem uma liderança forte e competente reagem às mudanças. É um facto que a Cinemateca, a direcção interina e os seus sempre excelentes programadores, têm feito nestes últimos meses alguma coisa para mudar. Mas é difícil quando não há um cérebro e um rumo a seguir! Continua-se a sentir (e já se sentia há algum tempo…) que a Cinemateca está algo fechada em si própria servindo apenas um grupo interessado, mas restrito de espectadores. E tem que ser mais do que isso inclusive para existir um polo no Porto. Para mudar um pouco bastaria por exemplo começar por comunicar melhor as actividades retirando-lhe um excessivo peso de erudição e distância do grande público, com uma promoção mais eficaz e agressiva. O desdobrável é bonito mas não dá jeito nenhum para consultar a programação. A Cinemateca tem uma imagem demasiado institucional e tem que ser um espaço mais informal ou pelo menos passar uma mensagem de informalidade. Quanto a uma nova direcção e para evitar uma decisão polémica, o melhor mesmo é recorrer a um concurso público. É a forma mais rápida e transparente de encontrar alguém com um novo projecto para a Cinemateca, como aconteceu no Museu do Chiado. As soluções podem vir de onde menos se espera! E assim fugir às pressões dos lobbies e ao mesmo tempo evitar a solução mais fácil que tem acontecido em outras legislaturas e direcções-gerais: a nomeação de uma figura sem competência técnica com um projecto pessoal a curto-prazo, vindo dos aparelhos politico-partidários. Era o pior que podia acontecer!
José Vieira Mendes, jornalista
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