RESUMO:Este ensaio pretende dar uma visão panorâmica do cinema contemporâneo centrado nos filmes estreados mais ou menos entre 2003 e 2006, filmes esse que reflectem uma certa tendência, ao nível da expressão e linguagem cinematográficas. O ponto de partida é efectivamente o cinema de Hollywood quando confrontado com as cinematografias independentes e do resto do mundo, abordando algumas diferenças e coincidências, entre elas. Por outro lado, referenciar o papel fundamental que têm as novas tecnologias digitais nos modos de produção cinematográfica, no mercado globalizado e no futuro do cinema.
DIVERSIDADEÉ a palavra-chave para definir a produção, distribuição e consumo do cinema contemporâneo. No entanto, trata-se de uma diversidade que se desenvolve em contextos diferenciados e a maioria das vezes, de uma forma um tanto desigual. Enquanto que os grandes majors nos EUA, privilegiam uma indústria poderosa, a projecção e o lançamento de filmes que garantam de imediato um sucesso de bilheteira logo no primeiro fim de semana, os produtores independentes e as cinematografias mais pequenas, desenvolvem grandes esforços ora para se auto-financiarem (com o apoio do Estado, como no cinema português) e praticamente têm que se limitar a uma distribuição alternativa, em salas estúdio, ou aos festivais internacionais.
Curioso é também observar que as tradicionais tecnologias analógicas convivem cada vez mais com a producção de filmes produzidos em digital e em HD, aproximando cada vez mais, algo que parecia, há alguns anos ‘azeite e água’: o cinema e a televisão. Actualmente continua-se na maioria dos casos ainda a rodar filmes como se fazia no início do século passado. No entanto, o celulóide é utilizado é ainda utilizado com produto final dos filmes (geralmente no formato 35 mm) cuja a produção e montagem foi inteiramente concebida num sistema digital. O computador tornou-se na extensão natural da imagem, do design de um set (cenário), de um fundo concebido com paisagens sobrepostas, e em sequências onde é cada vez mais difícil distinguir as sombras, as luzes, as cores e as figuras da realidade, das imagens concebidas virtualmente. Quer em grandes produções, quer nas de orçamentos mais limitados, argumentistas, realizadores e principalmente os produtores, estão cada vez mais convencidos dos benefícios do digital, pois esta tecnologia permite potenciar aquilo que o cinema tem de melhor desde os finais do século XIX: mostrar o mundo de uma forma diferente daquela que a vemos.
A criação de imagens e sons, e de inovação à custa do computador equiparou o cinema dalguma forma à literatura. O cinema foi capaz de superar as limitações espaço-temporais da realidade tornando-as perceptíveis concretizado-as em ambientes físicos, atmosferas psicológicas, e em figuras simbólicas. A imaginação criadora vinda directamente do ecrâ permite criar signos cinematográficos que não têm equivalentes com a nossa realidade: Como dar nome aos sons que produzem um ambiente de anti-gravidade, como nos filmes de ficção científica? Como referir-nos aos seres que já não estão fora deste planeta, mas antes fora já da nossa galáxia? O cinema não só desafiou a literatura, como também as ciências exactas, a física, a biologia e outras disciplinas cientificas.
TEMÁTICAS DO CINEMA CONTEMPORÂNEOO cinema está também a alterar as consciências e os hábitos dos espectadores, tanto ao nível do prazer como do entretenimento, principlamente os filmes provenientes da ‘grande indústria’. Para o bem e para o mal cinema tem porporcionado nos últimos tempos maioritariamente uma matriz de uma Hollywood tradicional, e até algo conservadora no plano ideológico e cultural. Os ‘filmes americanos’ são os que mais se projectam na maioria das salas de todo o mundo em detretimento das cinematografias nacionais e de outras cinematografias como menos potencial em termos de indústria e promoção. Além disso impuseram quase um modelo esteriotipado de criação, onde argumento, história, oersonagens e, processo de rodagem são muito semelhantes. Também ao nível do consumo, são maioritariamente dirigidos a um publico muito heterogéneo e às massas. Ao ponto que o público tem dificuldade em assimilar ou ter curiosidade em ver um filme que não seja falado em inglês. As fórmulas da comédia ligeira, do filme de suspense muitas vezes com uma história previsível, do terror hilariante, da denúncia politicamente correcta, do melodrama piegas, e muito recentemente há falta de melhores ideias os remakes, são os principais eixos narrativos da maioria das tramas cinematográficas ‘americanas’. Tramas essas que são quase sempre acompanhadas de personagens estereotipadas, situações comuns ou banais, em detrimento dos géneros clássicos, das personagens e das situações complexas, que fizeram do cinema a verdadeira Sétima Arte.
Não se trata de fazer aqui uma condenação desta forma de cinema, pois efectivamente o ‘cinema de entretenimento’ cumpre uma completa função social, ao qual está associada ainda um complexo sistema económico ao nível mundial, ligado á indústria do lazer. No entanto, é importante questionarmo-nos como nas últimas décadas se foram moldando os gostos populares insistindo na exibição interminável de estereótipos visuais, sonoros e narrativos, (também com a ajuda da televisão) chegando à preocupante conclusão de que o nível cultural imposto é cada vez mais baixo e o espectador cada vez menos exigente. É um facto que o cinema de Hollywood é na maioria das vezes, excessivamente óbvio nas suas tramas e desenlaces narrativos, mas é também bastante paradoxal nos tratamentos sociais e políticos de alguns temas. Nos filmes de Steven Spielberg, por exemplo não podemos deixar de reconhecer certas críticas às relações familiares e ao avanços científicos (Inteligência Artificial, 2002), ou às grandes decisões políticas internacionais (Munich, 2005), e inclusivamente, o mesmo questionamento dos impulsos de autodestruição da Humanidade (A Guerra dos Mundos, 2005), que dão ao realizador um estatuto de autor. Há que reconhecer ainda a utilidade social de determinados ‘filmes americanos’ recentes que puseram, na agenda dos espectadores, temáticas relevantes para a contemporaneidade em favor da tolerância cultural (Babel) ou mesmo da defesa do meio ambiente (Uma Verdade Inconveniente). 2006 por exemplo, foi um ano particularmente rico em qualidade (embora escassa) no que diz respeito aos filmes estreados comercialmente e na generalidade os prémios do ano, os Oscar e os Globos de Ouro, reflectiram de certa forma esta tendência para a diversidade no tratamento de temas socialmente sensíveis e que poderemos observar nalguns exemplos a seguir:
A TEMÁTICA GAY: Brokeback Moutain, de Ang Lee, 2005. A relação de amizade, secreta e homossexual entre dois cowboys. (A temática gay, marcada a outros filmes como Uma Família à Beira de Um Ataque de Nervos, Transamérica, Breakfast on Pluto, e um olhar para as descomplexadas séries de televisão como Sete Palmos de Terra ou Letra L);
COMICS NO CINEMA: V de Venganza, de James McTeigue 2005. Um activista social mascarado emprega estratégias terroristas para derrubar um governo autoritário (BD no cinema, ainda com Super Homem –O Regresso, X-Man 3, Sin City, 300)
ADAPTAÇÕES DE BEST SELLERS: O Código Da Vinci, de Ron Howard, 2006. O questionamento da fundação da cristiandade segundo o papel de Maria Madalena como amante de Jesus. (best sellers no cinema Memórias de uma Gueixa, O Perfume-História de um Assassino, A Dália Negra, Eragon, Os Filhos do Homem, Orgulho e Preconceito e próprio Casino Royal de Ian Fleming);
A VIOLÊNCIA E O HERÓI MORAL: Uma História de Violência, de David Cronenberg, 2005. O paradoxo social de um heroi moral. (a violência lactente nas sociedades contemporãneas, marcado também por The Departed-Entre Inimigos, de Martin Scorsese, curiosamente um remake de uma trilogia de Hong Kong, intitulada Infiltrados(Infernal Affairs I, II e III);
RACISMO E INTOLERÂNCIA: Crash, de Paul Haggis. 2005. A problemática do racismo da intolerância nos EUA mostrada a partir de um acidente automobilístico (a mesma temática contada em outras narrativas cruzadas como em Babel, Os Três Enterros de um Homem). Num ano em que curiosamente morreu Robert Altman, o percursor deste tipo de cinema das problemáticas sociais e das narrativas cruzadas e que sempre teve uma enorme dificuldade em se adaptar ao studio system.
OS ‘LIBERAIS’ DE HOLLYWOOD: Boa Noite, e Boa Sorte, de George Clooney, 2006. Um filme dirigido pelo grande símbolo liberal (e sexual) da América, e que homenageia todos os que enfretaram a tirania dos poderes de Washighton e do imperalismo americano em temas também que criticam a situação política mundial: Munique, A Caminho de Guantanámo, Máquina Zero;
BIOPICS: A Rainha, Stephen Frears, 2006, os dias criticos da familia real a seguir à morte da Princesa Diana (um ano de biopics Capote e Infame sobre Truman Capote, Corrigindo Bethoven, Um Passeio Pela História sobre Miterrand);
O 11 DE SETEMBRO: World Trade Center, de Oliver Stone e Voo 93, de Paul Grengrass, o 11-S, chegam finalmente ao cinema depois dos segmentos das curtas, intitulado, 11.9.04
FILMES ORIENTAIS: O cinema oriental, desde os filmes de artes marcias, estética e visualmente muito belos e poéticos aos mais violentos, aos autores coreanos (Kim Ki Duk, Park Chown Hook), chineses (Tsai Ming-Liang, Jia Zhang-ke, Johnnie To), tailandeses (Apitchapong Weerasethakul), japoneses (Miike Takashi, Takeshi Kitano) ou os iranianos (Samira Makhmalbaf ou Mohsen Makhmalbaf, Jafar Panahi, Abbas Kiarostami, Bahman Ghobadi)
OS DOCUMENTÁRIOS NO MAINSTREAM: Os documentários como Uma Verdade Inconveniente a Lisboetas (quase 16.000 espectadores) de Sérgio Trefaut que foi um dos filme português mais visto do ano a seguir a Coisa Ruim, de Tiago Guedes e Frederico Serra e sem contar claro com Conversa da Treta.
INDEPENDÊNCIA E INOVAÇÃOQue modelos se opôem então ao cinema de Hollywood, em termos da produção e o consumo dos chamados filmes independentes ou de algumas tendências cinematográficas nacionais, nomeadamente as europeias? Digamos que estes modelos se confrontam mais ao nível ideológico do que estilístico ou cinematográfico, pois após os movimentos político-artísticos dos anos 60, há que reconhecer mesmo na Europa, também um certo esgotamento expressivo do ‘cinema de autor’ e ‘independente’ tanto ao nível das histórias, como das suas linguagens, embora houvesse fortes tentativas de radicalização como a movimento Dogma 95 (Lars Von Trier, Thomas Vintenberg, Kristian Levring e Soren Kragh-Jacobssen). Apesar do grande impulso do Instituto de Sundance e do seu Festival, dirigido por Robert Redford ao nível da cinematografia norte-americana, o adjectivo novo ou independente em nossos dias não assenta muito no respeito pelos principios de uma determinada concepção da Séptima Arte, tirando raríssimas excepções (talvez num extremo David Lynch, como a maior e a mais conhecida), mas antes numa tendência ideológica que aposta num cinema libertador das consciências e dos ‘maus-estares do mundo’, talvez mais do que na perspectiva artística. Isto, porque certos cineastas que defendem um certo activismo político, a verdadeira arte do cinema é aquela que assenta na representação no social. Realizadores americanos como Spike Lee em A Última Hora, Ela Odeia-me, Infiltrado ou mesmo Steven Soderbergh em Bubble — um cineasta que oscila entre o experimental e o comercial com Ocean’s 11, 12, 13) fazem um cinema comprometido com o realismo social sendo que as suas pricipais fontes de inspiração sejam as injustiças políticas, a discriminação racial, factos históricos ou políticos ou mesmo fait divers sobre as condições humanas e a problemática cultural. Se alguma coisa Hollywood aprendeu das formas de produção independente é o de retomar de também certas temáticas e estilos de outras épocas e países, eliminando aquilo que pode ser aborrecido ou excessivo para a maioria dos espectadores. Por isso, teve que modificar os finais de alguns filmes, censurar sequências, ou mesmo recusar propostas abertamente ambíguas ou chocantes. Hollywood, neste momento não só promove as suas belas actrizes e actores, como aposta forte em outros protagonistas para realizar e cumprir com as expectativas de bilheteira. Há uma profunda alteração do estatuto de autor, aproveitando a fama dos realizadores, colocando-os ao nível dos autores europeus dos anos cinquenta e sessenta (Quentin Tarantino, Clint Eastwood, Steven Spielberg, Jim Jarmuch, ou Martin Scorcese). O escândalo, a polémica são também algumas das mais efectivas estratégias para atrair o público às salas de cinema (A Paixão de Cristo de Mel Gibson, ou mesmo Brokeback Moutain). Quando certos grupos mais conservadores ou empresas tentam que um filme não seja lançado nas salas, acontece o efeito contrário com o agrado discreto das companhias produtoras e exibidoras de cinema. Foi precisamente o caso de A Paixão de Cristo, que fez scores de bilheteira verdadeiramente extraordinários o caso mais marcante desta tendência da indústria. Mesmo assim temos que admitir que há algo de novo no cinema contemporâneo mundial, quanto mais não seja ao nível dos modos de produção em que se integra obviamente a era do digital. Em resumo, pode dizer-se que se ‘novo’ é um termo que deveria descrever as recentes tendências, temas e linguagem, a grande novidade no cinema contemporâneo consiste precisamente em que não há efectivamente muitas novidades, mas antes muita diversidade e singularidade. Mas estes são os sinais dos tempos ao nível de todas as artes do espectáculo.
MODOS DE PRODUÇÃO
E INDÚSTRIA DO ENTRETENIMENTO Com o aparecimento das tecnologias de reprodução caseira, o cinema ampliou os seus espaços de consumo cultural. O cinema visto nas salas de cinema é mais uma opção entre outras. Talvez continue a ser indiscutivelmente a melhor opção e a que melhor propicia um verdadeiro local para ver e ouvir filmes: o tamanho do ecrã, a imersão do som, o privilégio que guarda a centralidade da visão e o facto de assistir-mos numa sala com mais pessoas, traduzido um ritual social de convivência e entretenimiento, sobretudo, entre os mais jovens, que são os maiores consumidores de cinema nas salas. Este ritual transformou-se numa práctica cultural de entretenimiento em outra que engloba um processo económico globalizado, por exemplo, o custo do bilhete acrescido de um valor para o consumo de venda de comida rápida ou de pipocas, curiosamente pertencentes às mesmas cadeias exibidoras.
À globalização da produção, distribuição e exibição do cinema dominante, chamamos agora ‘blockbusters’. Esta noção refere um modo de produção do cinema de Hollywood que actualmente está vinculada com a ‘mercadotecnia’ do entretenimento que valoriza o filme como um elemento detonador de um processo económico mais amplo, de venda de diversos produtos, a ele associados. Os primeiros blockbusters apareceram nos anos 70 com as estreias de A Guerra das Estrelas (George Lucas, 1977) ou o Tubarão (Steven Spielberg, 1975). Além de uma estrutura narrativa referenciada nos géneros clássicos, os blockbusters procuram o máximo de benefício económico em muito curto prazo, (às vezes logo no primeiro fim de semana de estreia) e agora pouco tempo depois (cerca de 2 meses) a seguir à estreia, que seja lançado o DVD - Digital Versatile Disk colocando à disposição do espectador outros materiais adicionais além do filme. E para além do DVD até outros materiais audiovisuais complementares. Acompanham na maioria das vezes o lançamento do DVD, os videojogos (como aconteceu recentemente com o lançamento da Playstation 3, simultaneamente com o jogo 007/Casino Royale) ou a mesmo da respectiva banda sonora. Se cada produto, está vinculado ao filme, não deixa por isso de ser independente como forma de entretenimento autónoma. É também esta lógica financeira, utilizada também pelos restaurantes de comida rápida pelos fast foods (MacDonalds) e as empresas de refrigerantes que se associam muitas vezes aos filmes.
A globalização alcançou também os profissionais que trabalham no meio cinematográfico, pois para além das muitas co-produções internacionais é cada vez mais comum encontrar num mesmo filme criativos e técnicos de várias nacionalidades (Babel). Por exemplo, uma filme de Hollywood dirigido e fotografado por dois mexicanos (Alejandro González Iñarritu e Emmanuel Lubezki) musicada por um argentino (Gustavo Santollala) e interpretado por actores de várias nacionalidades de Brad Pitt, norte-americano a Cate Blanchette, australiana, além da actriz mexicana e os dois japoneses. As Cartas de Iwo Jima, dirigida por Clint Eastwood, com actores japoneses e totalmenter falada em japonês. Esta distribução de nacionalidades, acrescentada ao esquema de co-produções, problematizam e diversificam cada vez mais a origem dos filmes e desvanecem as fronteiras das cinematografias nacionais, dando lugar a um tipo de cinema dominante que chega às salas e que é infelizmente mesmo com algum rótulo de independente de alguma forma estandarizado.
O FUTURO DO CINEMA O que aí vem não estará certamente reduzido apenas a salas fechadas de acesso limitado, com um ecrã branco em frente a uma plateia de cadeiras mais ou menos confortáveis e com óptimas condições de visão e audição, em 2D ou 3D. As produções de grande orçamento ou mesmo as de autores independentes estão usando cada vez mais as tecnologias digitais que diminuem substancialmente os custos de produção, para além de virem a poder facilitar outras formas de distribuição e consumo dos filmes, a começar pela própria Internet e de servidores como o You Tube, onde são descarregados diariamente, milhares de produtos audiovisuais. Para além disso o aparecimento do DVD (agora com os dois novos formatos Blue Ray e HD) desde 1995, acostumaram-nos a outro tipo de leituras cinematográficas. Ver um filme neste novos suporte permite uma reprodução de alta qualidade de imagem e de som, a qual permite ainda ser melhorada tivermos instalado um sistema de home cinema, quase igual ao das salas comerciais. As possibilidades narrativas (e até criativas) abrem-se ainda mais para o espectador graças à oferta de um menú interactivo, com informação e material complementar. É possivel ver com este dispositivo cenas suprimidas, finais alternativos, versões do realizador e o processo de rodagem e montagem, comentados por ele próprio. Por outro lado, um árduo trabalho de restauração digital de imagens e sons de filmes históricos ou clássicos, inclusive da propria música a partir das partituras originais, foram agregados a um sem número de obras, algumas delas de cinema mudo e cujo o produto não é mais o celulóide mas antes um DVD. A digitalização também teve efeitos na distribuição dos produtos cinematográficos. Como por exemplo nas estreias mundiais e em simultâneo de películas como Matrix Reload (Andy e Larry Wachowski, 2003), Senhor dos Anéis: O Regresso do Rei (Peter Jackson, 2003), o de O Código Da Vinci (Ron Howard), o ano passado em pleno Festival de Cannes e com o maior dos secretismos à volta do seu lançamento. Exemplos que nos podem orientar de como no futuro os filmes podem ser descarregados de qualquer servidor ou serem enviados por satélite para as diferentes salas de cinema de todo o mundo desde um centro emissor, eliminando as tradicionais cópias em celulóide. Se bem que a tecnologia já pode oferecer este serviço, aparentemente a imagem digital ainda talvez não consiga na sua globalidade os níveis de qualidade em relação ao contraste, reprodução de detalhes e cor que caracterizam ainda os processos foto-químicos próprios dos produtos cinematográficos tradicionais e que remontam como se sabe a 1895. Um DVD pode conter galerias de imagens fotográficas, fichas técnicas e mudanças de perspectiva da própria câmara, comentários do realizador. Estas possibilidades fazem com que este produto tenha um valor de troca e um valor simbólico superior ao filme original: de troca porque a sua comercialização está especializada segundo determinadas estrátégias de distribuição e mercado; simbólico porque se pode conservar o filme, quer seja por um motivo pessoal ou por tratar-se de um documento cinematográfico de grande valor social, cultural ou histórico.
Em relação aos tratamentos narrativos e estilísticos continuaremos certamente nos próximos anos a ver um cinema basedo na diversidade. Continuar-se-ão a programar filmes de vários géneros, remakes, com tramas excessivamente óbvias, com efeitos especiais cada vez mais sofisticados e que ocultarão com maior precisão a falsidade da sua origem graças à manipulação digital. No entanto, e felizmente nos mesmos complexos de salas multiplex onde se projectam os mais rentáveis filmes da indústria de Hollywood, coexistirão outras possibilidades, embora limitadas, de ver outro cinema: o cinema do mundo, cinematografias minoritárias, cinema independente, cinema provocador, cinema incomprensível, poético ou artístico, o que quiser-mos chamar-lhe sem correr os risocos de o rotularmos excessivamente ou congregá-lo numa escola, movimento artístico ou ideológico. Não podemos ser alheios também ao cada vez maior número de festivais de cinema nacionais e internacionais que se debatem entre o glamour, a superficialidade da grande indústria, o mercado, (Cannes) os grandes lançamentos promocionais e outros mais pequenos que fomentam a cultura cinematográfica nos espectadores, como por exemplo no nosso país, com destaque para os mais antigos Fantasporto, Vila do Conde, e os novos IndieLisboa ou o Doc Lisboa.