MOURINHO DA CULTURA

Tuesday, June 24, 2008

BUIKA: A NIÑA DE FUEGO



Su voz vuela indomable y tierna entre árboles de agua, agua de luz y mentiras cobardes.
Su voz es como un beso desgarrador. Como un eterno beso de niña… La niña de fuego.


Os cruzamentos entre o flamengo cigano, jazz de fusão, blues, bolero e a potente voz rouca de Buika, fazem de Niña de Fuego um dos álbuns musicais mais refrescantes para as noites quentes desta Lisboa veraneante, cada vez mais cosmopolita e multicolor. Curiosamente, Buika é um dos nomes marcantes da música espanhola actual, nasceu em Palma de Maiorca e com o primeiro nome Concha, apesar da sua origem da Guiné Equatorial. Por isso é uma cantora que faz a ponte entre a Europa da Sul, África e a América Latina, aliás algo cada vez mais comum no país vizinho, numa verdadeira abertura a outros mercados multiculturais e a outras musicas.
Niña de Fuego é um álbum composto por canções de amor e desamor (Culpa Mia e La Falsa Moneda são grandes momentos, que mistura belas canções originais de Javier Limón, com temas mais antigos e standards, num reportório de uma rara beleza e de renovação dos vários géneros musicais. Leveza, intensidade, sensualidade e prazer na voz única de Buika e num álbum a não perder.

BAMBOO BLUES, DE PINA BAUSCH: UMA ÍNDIA DE SONHOS



De Istambul a Hong Kong, do Brasil a Lisboa, não importa em que ponto do mundo, Pina Bausch vem captando ao longo das suas últimas obras, e fruto das suas residências artísticas, a essência dos lugares e dos seus habitantes. São as cores, cheiros, texturas, sabores, os sons e a música, que marcam a sua impressão desses lugares muito além do visível, e curiosamente com um humor que não era de todo um recurso dramatúrgico em obras tão emblemáticas como Sagração da Primavera (1975), Café Müller (1978), Kontakthof (1978), 1980 (1980) e Viktor (1986), símbolos de uma linguagem revolucionária, que espantou os espectadores e teve a sua estreia portuguesa, com Auf dem Gebirge hat man ein Geschrei gehört (E na Montanha ouviu-se um Grito, de 1984), nos Encontros Acarte de 1989.
Se os seus trabalhos já não são os mais referentes de um danztheatre, que já teve melhores dias, como se viu no recente Festival Pina Bausch realizado em Lisboa há pouco mais de um mês, são pelo menos mais felizes e conciliatórios com a vida e serão sempre uma reavaliação das transformações dramatúrgicas de Bausch, do seu percurso e do novo mundo em que vivemos. É novamente o espírito da descoberta e de uma Índia em transformação, o mais recente porto de escala, que marca o seu último trabalho Bambu Blues, uma produção de maior escala do que as habituais residências e que conta com um elogioso guarda-roupa de Marion Cito e a direcção musical de Matthias Burkert e Andreas Eisenscheneider. A coreógrafa alemã volta a criar em palco uma amálgama de sensações e prazeres, aliados aos doces e poderosos movimentos. A suavidade dos movimentos a solo prevalece em relação ao conjunto dos bailarinos, num envolvimento traçado pelos tecidos coloridos, pelo algodão, e pelos cenários e vídeos de Peter Pabst, o seu habitual art designer, combinados com os inebriantes movimentos das danças indianas e uma luz, uma luz celestial que nos transporta para uma Índia dos nossos sonhos.

Friday, June 20, 2008

O NOVO CINEMA MEXICANO



Desde El Rey del Barrio, um filme da Idade de Ouro e das décadas de 30/40 que o cinema mexicano não vivia uma época tão profícua e de tanta euforia. Se o ano passado se produziram mais de 70 filmes, em 2008 espera-se que cheguem às 80 as produções que vão estrear nas salas e circular pelos festivais e mostras de cinema. Os ‘Três Amigos’ (Guillermo del Toro, Alfonso Cuarón, e Alejandro González Iñárritu) são já uma espécie de Santíssima Trindade da indústria cinema mundial e os símbolos máximos de uma geração de cineastas que cresceu entre os pobres mariachis e a Hollywood dos ricos. Fala-se agora de uma nova era ou de uma nova onda de filmes e cineastas capazes de devolver ao México um certo orgulho perdido, quer com um cinema mexicano popular por excelência, quer com um cinema mais autoral e que vem circulando pelos festivais internacionais de cinema. O star system e a notoriedade internacional de actores como Diego Luna e Gael Garcia Bernal (outros dois amigos na realidade e a dupla de E a Tua Mãe Também! de Cuarón, são sócios também de uma nova produtora de filmes) têm igualmente ajudado a construir uma nova faceta para o cinema mexicano. Bernal, que é uma das estrelas internacionais de Blindenss, de Fernando Meirelles, até se estreou recentemente como realizador em Déficit, um filme despretensioso, uma primeira obra, onde além dele, estão actores desconhecidos para contar a história de uma festa organizada numa grande mansão de campo, por dois irmãos ricos, confrontados pelas diferenças sociais dos empregados da casa.

É de certo modo verdade que o México é conhecido caricaturalmente no mundo pelas suas histórias de mortos-vivos (Pedro Páramo, de Juan Rulfo, aguarda o início de uma rodagem com participação portuguesa), mas também por uma grande tradição no cinema. Nesta altura, assistimos ao aparecimento de um punhado de bons filmes (contos rurais, dramas urbanos, tragicomédias e excelentes documentários) e de cineastas de eleição, mas ainda não é possível e apesar do número razoável de produções, falar de uma verdadeira indústria de cinema. Everardo González, é um destes cineastas da nova geração que o ano passado estreou Los Ladrones Viejos, um filme premiado no famoso e popular Festival de Guadalajara (a terceira cidade mais importante do México) recuperando as leyendas del artegio, histórias dos delinquentes de rua dos anos 60, do populoso DF (Distrito Federal da cidade do México, a capital que coincide com o nome do País). Através dos seus testemunhos o filme aborda muitas das questões sociais vividas pelos mais pobres. Na Competição Oficial da Berlinale (e curiosamente também na Semana da Crítica em Cannes, onde ganhou o Prémio Revelação da FIPRESCI) passou uma pequena pérola intitulada Lake Tahoe (Te Acuerdas de Lake Tahoe?), de Fernando Eimbcke (Temporada de Patos) que felizmente está comprado para Portugal, pela nova distribuidora Panthéon, e à espera de uma oportunidade de estrear nas salas. Lake Tahoe foi rodado em muito poucos dias, com a câmara com que Carlos Reygadas (outro cineasta que tem reivindicando um estatuto de autor na Europa, com filmes como Batalha no Céu e Japão), filmou o seu último Luz Silenciosa (a história de adultério no seio dos Menonitas, apresentado em Cannes o ano passado), com um orçamento mínimo, actores não-profissionais, e com uma história de um adolescente um pouco perdido e à procura de algum afecto. Lake Tahoe é um filme muito simples e minimalista, no entanto muito carregado de verdade e naturalismo da vida de um adormecido pueblo do interior de México.

De facto, esta euforia deve-se em parte aos ‘Três Amigos’ ricos que ultrapassaram as fronteiras do Golfo, mas passa muito pelo espírito de entreajuda entre os vários jovens realizadores emergentes, cineastas/actores/produtores com muito sentido prático e pouco dinheiro, que sentem que o mais importante é fazer filmes. Eimbcke tem 37 anos, é um dos cineastas marcantes deste novo caminho que vai rompendo com os esquemas mais académicos de produção iniciado com um filme fundador e geracional: E a Tua Mãe Também! de Alfonso Cuarón. Carlos Reygadas era um advogado e tinha uma promissora carreira como diplomata, mas optou pelo cinema (ou pelo cinema contra-corrente) e já é um autor reconhecido na Europa e nos EUA. Iñárritu é já de outro campeonato. Veio da publicidade e tornou-se um referência das histórias cruzadas, de Amor Cão, passando por 21 Gramas, até Babel, e quase sem querer é uma espécie de papa de uma certa tendência actual, a que muitos chamam a babelização do cinema contemporâneo.

Quando se fala do novo cinema mexicano, além dos já referidos, é inevitável destacar cineastas como: Amat Escalante (Sangre) apresentou em Cannes Los Bastardos, na secção Un Certain Regard, (um filme produzido por Reygadas); Gerardo Laranjo (Drama/Mex) e Rodrigo Plá, realizador de La Zona, estreou Desierto Adentro, são já mais do que revelações com histórias que giram quase sempre à volta dos mesmos temas (religião, ritos, pobreza, desenraizamento, violência). Juan Carlos Martín conhecido pelo excelente documentário sobre o artista Gabriel Orozco, estreou-se agora na ficção com 40 Días, um road movie filmado entre o DF e Nova Iorque, com dinheiro do seu próprio bolso e com uma pequena equipa constituída por 18 pessoas. Algo que marca e acompanha uma nova tendência nos modos de produção cinematográfica. Trata-se de uma viagem num descapotável de estilo, de um casal acompanhados de um amigo gay em profunda depressão, e ao que consta marcado por uma espantosa interpretação de Andrés Almeida, actor e líder de um grupo de música electrónica, curiosamente num ‘filme filho’ de E a tua Mãe Também! Há ainda, a aguardada estreia de Rudo y Cursi, de Carlos Cuarón (o irmão de Alfonso), de quem se esperam voos mais altos.

Num país com mais de 105 milhões de habitantes, o panorama do cinema mexicano não é nada mau, se tivermos em conta que em 2007 se produziram cerca de 74 longas-metragens. Em 2006 chegaram aos 62 filmes e 2008 promete ser ainda melhor em termos de produção cinematográfica. México, Argentina e Brasil, concentram cerca de 85 % do mercado audiovisual da América Latina. Ir ao cinema para os mexicanos é um luxo acessível apenas a cerca de 15% da população. Uma entrada custa cerca de 50 pesos(€ 3,14), os salários são baixos e uma grande maioria das pessoas vive no limiar da pobreza ou na precariedade de emprego. No entanto, Perisur, um complexo situado em plena cidade do México é a segunda sala que mais entradas de cinema vendem em todo o mundo. Só superada por uma outra grande sala em Bombaim, na Índia, centro da indústria de Bollywood. O cinema visto no México é mais ou menos igual ao que se vê no resto do mundo. Na maioria são filmes de Hollywood, que fazem mais receitas e espectadores do que os filmes nacionais e independentes. Nos finais da década de 90, o cinema mexicano tinha como que batido no fundo com a fuga de criadores (realizadores, técnicos e argumentistas, entre eles o famoso Guillermo Arriaga), para Hollywood e para a Europa. No entanto, algo parece estar a mudar com esta onda positiva em grande medida assente nos apoios governamentais ao cinema: a existência de uma taxa de incentivos, conhecida por Artigo 266 e por um Fundo de Investimento e Estímulo ao Cinema, (curiosamente à semelhança de Portugal, uma para filmes de autor e o outro para os mais comerciais). Trata-se, de uma lei que proporciona incentivos fiscais às empresas que apoiam o cinema e ajudas substanciais às empresas produtoras de filmes.

Texto para apresentação da Mostra de Cinema Mexicano, a realizar em Lisboa no próximo mês de Julho.

José Vieira Mendes
Jornalista e crítico de cinema

ÓPERA, CINEMA, FUTEBOL E PIPOCAS



Numa altura de grande crise de espectadores nas salas de cinema, com o Euro 2008 a acentuar a tendência, talvez seja o momento de exibidores e distribuidores diversificarem a programação, procurando conteúdos alternativos aos filmes: futebol, ópera, concertos de rock, séries de televisão ou videojogos, espectáculos que por vezes também poderiam passar para o grande ecrã e para o escurinho do cinema.
As tecnologias de difusão caseiras, aliadas à grande crise económica que vai mexendo com os nossos bolsos, tem sido a responsável por uma grande quebra das receitas e de espectadores nas salas de cinema. Assim, e olhando para o mercado, podem perfilar-se novas formas de desfrutar um espectáculo, isto é, numa nova dimensão, algo que pode abrir caminhos para resistir à recessão e ser uma boa oportunidade de negócio para os exibidores e distribuidores de conteúdos.
De certo modo até funciona com o rock e com filmes como Shine a Light, de Martin Scorcese sobre os Rollings Stones. Na prática trata-se do registo de um concerto rodado ao vivo tal como o dos U2 projectado em 3D. Mas poder-se-ia também projectar ou transmitir determinados espectáculos ao vivo como Rock in Rio, Optimus Alive, Super Bock, ou mesmo determinados grupos, nas salas de cinema, isto para os mais comodistas e que não gostam de ir para o meio da barafunda. A reprogramação das grandes séries de televisão nas salas seria certamente um grande êxito tal como, por exemplo, o sucesso da versão- filme de Sexo e a Cidade.
O caso da ópera também pode ser significativo. Mesmo não tendo conhecido um grande sucesso de espectadores, Das Marchen do compositor Emmanuel Nunes, uma obra contemporânea, pouco acessível, foi transmitida em directo para 14 cine-teatros portugueses, no passado dia 25 de Janeiro. As salas de cinema podem ser uma boa alternativa, já que toda a gente sabe que não é propriamente fácil encontrar bilhetes para uma récita no S. Carlos, além disso, é um local de culto que intimida alguns espectadores, mesmo aqueles que não gostam de comer pipocas na sala de cinema. A ópera não cola com as pipocas, mas pode ser uma oportunidade para muita gente que nunca foi sobretudo ao S. Carlos.
Quanto ao futebol, não há qualquer dúvida, se existem multidões que se juntam em Lisboa, na Alameda, ou nos restaurantes das Docas para desfrutar em conjunto das alegrias que até agora nos tem dado a Selecção Nacional, imaginem o que não seria se as excelentes salas de cinema, como as do El Corte Inglés, Campo Pequeno ou Zon Lusomundo Colombo / Vasco da Gama, aproveitassem o fresquinho do ar condicionado e passassem a transmissão da TVI em alta definição, com as devidas autorizações, como fazem habitualmente com a Noite dos Oscars.

Wednesday, June 18, 2008

O CORAÇÃO DO MUNDO



‘Chegou o momento de entrar no coração do império intercontinental e multicultural, o santuário da mestiçagem e da ambiguidade faustosa. Sem esquecer que este estreito, teve, com a outra margem do Mar Negro, de servir de ponte (Hellespont…) aos grandes movimentos de populações que, há seis ou oito mil anos, trouxeram do sudoeste do continente europeu a arte de criar e semear, e em seguida de fundir e trabalhar os metais. É a fusão de dois mundos, a placa giratória da própria noção de civilização, o ponto para onde convergem as intuições vindas da China e da Índia, da Pérsia e da Mesopotâmia, do Egipto, da Grécia e de Roma. É o impasse da Antiguidade (…). É o lugar conhecido como sendo a mais antiga fonte de nostalgia dos Ocidentais, (…) de Pierre Loti, de Lord Byron ou de Agatha Christie. Foi durante muito tempo a estação terminal do agora onírico Expresso do Oriente, o ponto de convergência de todos os fantasmas viajantes, a Jerusalém poética por excelência…’

In Istanbul - texte et photographies de Gil Jounard, Collection Les Portes Clandestines, L’Archange Minotaure 2005 -

Tuesday, June 10, 2008

A SERPENTE E A MONTANHA


Foto: A Serpente de Francesca Woodman


'Segundo Ibn Arabî, que afirma tratar-se de um facto verídico, um dos seus amigos, que era um dervixe abdalita, foi içado até aos céus pelos espíritos, atingiu o Monte Kaf que cerca o universo e verificou que essa montanha estava ela própria, cercada por uma serpente. Sabe-se hoje que não há montanha que cerque o universo, como também não há serpente que cerque a montanha.'

Enciclopédia do Islão

Friday, June 06, 2008

AS ÚLTIMAS ESTRELAS





Madonna (16 de Agosto), Michael Jackson (29 de Agosto), Prince (7 de Junho), comemoram este ano 50 anos de vida e o pequeno Rogers Nelson, de Minneapolis, já amanhã. Parabéns Mr. Prince! Apesar da idade, os três continuam a reinar no mundo da música e da cultura pop. Provocadores, geniais, sensuais, cada uma à sua maneira, aliás entre eles há mais contrastes que coincidências, continuam a ser a marca de uma geração que soube aproveitar uma espécie de ‘movida’ mundial, das loucas e pujantes (do ponto de vista criativo), décadas dos anos 80/90.
Na verdade, e apesar da controvérsia de algumas situações, como as de Michael Jackson, a tríade soube antecipar-se à grande derrocada do negócio da música, que ainda não conseguiu criar figuras para os substituir. Se os artistas de hoje estão como que miniaturizados no YouTube, no ecrã do computador ou nos auscultadores dos MP3, e as vezes até parecem virtuais, Madonna, Prince e Michael Jackson são artistas que nasceram numa época em que antes de tudo estava o carisma, para chegar ao palco de um grande estádio e vender muitos discos.

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